Nós ainda estamos aqui – O Roller Derby e a Representatividade Negra

Mais uma vez é 20 de novembro, Dia da Consciência Negra. A data histórica representa o assassinato do líder Quilombola Zumbi dos Palmares, que junto com Dandara dos Palmares, lutou pela libertação dos negros no Brasil.

No entanto, anos de repressão deixaram marcas visíveis até hoje em nossa sociedade. Negros, ainda que supostamente nas mesmas condições, encontram um nível elevado de obstáculos em relação a não-negros para chegar a qualquer lugar, seja ele um cargo ou posto social. A consciência real, o empoderamento e a revolta de cada dia são recém-nascidos (ou recém-acordados) na sociedade brasileira.

E é aí que entra o Roller Derby. A diversidade que envolve o esporte atrai pessoas de todos os gêneros, formas e ideais, aceitando-as como são e acolhendo-as como parte da família. Mas onde está a comunidade negra? Atualmente somos três. Mas por que não cinco, dez, doze?

Muitas vezes, não só no Brasil, é possível contar nos dedos quantos integrantes negros há em uma liga. Nós, na Wheels, somos três – a título de comparação, o Roster do time All-Star das Gotham Girls Roller Derby (que fez o aquecimento para a final do Campeonato da WFTDA usando a camiseta “Black Lives Matter”) conta com uma pessoa negra – Bonita Apple Bomb.

Além disso, o fato de o esporte ser inclusivo e repleto de pessoas compreensivas e dispostas a ouvir ideias e explicações alheias sobre temas que não dominam não nos isenta de ter de desconstruir conceitos profundamente enraizados e dar certas explicações.

TJ “Scarbie Doll” Edwards, criadora da Black Roller Derby Network – que reúne o maior número possível de pessoas negras envolvidas com o esporte, sejam jogadores, árbitros, treinadores e apoiadores (incluindo gênios da track como Freight Train, Trouble MakeHer e o próprio Quadzilla) – sintetiza o tema:

– Se não há propaganda do esporte direcionada à comunidade negra, ela não será representada nele;

– Às vezes, há coisas que só outro skater negro é capaz de entender.

Uma breve análise de adesivos, artes, vídeos, filmes e demais representações de Derby na mídia dá a entender que, de fato, não há, ou há pouquíssimos negros no esporte. De modo algum a culpa é da comunidade não-negra (o ponto é, inclusive, amplamente debatido pela  comunidade estrangeira. Até agora não se chegou a um entendimento comum do motivo pelo qual negr@s não entram ou não permanecem em ligas), mas quando “nós” não nos vemos, ficamos receosos de fazer parte de qualquer coisa, desde comprar um produto a tentar despontar em um esporte. Vejam bem, é difícil fazer história.

Foi desse modo que, após anos de história pelos quais ainda somos afetadas, surgiu esse pequeno manifesto. Dentro desse esporte maravilhoso que empodera e representa, desejamos ser agentes de empoderamento e representação daqueles que, por algum motivo, se sentem receosos de entrar em uma liga. Desejamos representar e sermos representadas por pessoas com o mesmo tipo de cabelo e cor da pele que nós.

A comunidade negra do Roller Derby existe, e ela não vai parar de rolar.

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Foto tirada no 4º Brasileirão de Roller Derby, em 2015, com integrantes de algumas ligas do Brasil. Hoje já é possível afirmar que há mais negras compondo os times, mas o número ainda é pequeno se comparado com a comunidade dérbyca.

 

PS.: recentemente foi criado um novo espaço seguro para troca de experiências e dicas, abrangendo toda a comunidade POC (“People of Color”) do Derby, representado pela página Shades of Skate!

Kira #93

Tornando-se uma Wheels

Eu nunca esquecerei quando eu vi pela primeira vez o filme Garota Fantástica e pensei “Cara se tivesse esse esporte aqui eu faria muito certo, eu sei andar de roller e quero muito isso!”. Acredito que isso foi em 2011.

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Então, em 2013, passando pelo prédio em que moro hoje me deparei com um lambe-lambe… Era o desenho de uma mina bem brabona de capacete. Dizia “Recrutamento das Wheels of Fire” e mencionava o tal de Roller Derby. Bateu uma emoção forte. Será que se tratava do mesmo esporte do filme? Será que as deusas escutaram as minhas preces?! Sim! Na realidade o esporte era diferente daquele mostrado no filme, era mais agressivo, contudo era praticado com patins e as minas desse rolê eram mó casca dura que nem as do filme, então pensei “Meu… é nesse lance que eu tenho que me meter”. Só em 2015 fui no recrutamento, pois antes tinha vários os compromissos e eu não queria acabar me apegando a algo de que não poderia fazer parte. Porém em 2015 também não pude entrar pro clube por não ter como investir em equipamentos. Mas em 2016 fui a um treino determinada a fazer parte da equipe sem medir esforços.

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Em Julho desse ano assinei o meu termo de compromisso, comprei meus equipamentos, passei a ir nos treinos, a buscar mais informações sobre o Roller Derby, as regras e o funcionamento do jogo. Parecia que ia ser difícil, mas não. A gente vai se apaixonando pelo Derby e isso torna o processo algo prazeroso, ainda mais com o apoio de todos que fazem parte das Wheels que estão sempre dispostos a explicar todas as dúvidas que tive e continuo tendo.

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16/10/2016 – Pós-Brasileirão. O primeiro jogo da minha vida. Apesar de ainda desequilibrar, de não saber todas as skills, de ter medo dos hits e de ter tido um certo arrependimento de ter me inscrito para o jogo sem contato, eu fui. Por dois motivos: me superar e para mostrar para as minhas colegas Wheels que eu não desistiria mesmo que eu fizesse tudo errado. Eu só queria mostrar pra elas que eu não vou fugir, que eu vou continuar tentando mesmo não tendo tanto tempo para treinar e melhorar meus conhecimentos. Eu vou continuar tentando, porque me apaixonei portudo que envolve o Roller Derby, inclusive coisas que vão além do jogo, como o fortalecimento do corpo e da mente, o companheirismo e o amor que envolve essa galera que mantém esse esporte de forma autônoma com tanta dedicação.

Isso para mim é ir contra o sistema.

Isso para mim é lindo demais.

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Foto por Joel Lima

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Foto por Joel Lima

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Foto por Joel Lima

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Foto por Joel Lima

JuJu #333

Entendendo as chaves de competição do International WFTDA Championship

Quem é mais experiente no roller derby (e quem quer conhecê-lo melhor) provavelmente já acessou o canal da WFTDA no youtube onde são disponibilizados todos os jogos sancionados pela entidade organizadora oficial do roller derby. Nele você acessa na íntegra os jogos da competição internacional entre-ligas oficial, o International WFTDA Championship. Porém, entender a organização do maior campeonato do esporte, com 60 times distribuídos em duas divisões, e quatro rodadas antes da competição final com os 12 melhores times, não é tão simples. Por isso, apresento aqui uma explicação simplificada da organização do campeonato:

Primeiramente, deve-se conhecer o ranking das ligas-membro da WFTDA. Trata-se de uma classificação feita pelo menos a cada bimestre, que classifica as ligas de forma que a 1ª colocada seja considerada a melhor liga de acordo com os critérios pré-definidos da WFTDA. Esses critérios levam em conta a quantidade de jogos ganhos nos últimos 12 meses, a diferença de pontos por jogo em relação ao adversário, bem como o quão desafiadores são os times contra os quais este jogou. Explicar o ranking daria um texto por si só, quem quiser conhecer o algoritmo de classificação pode acessar esse link. Mas basta saber que a classificação final em Junho serve de base para o campeonato, sendo que os 40 primeiros colocados são elegíveis para a 1ª divisão da competição, e os classificados de 41 a 60 jogam na 2ª divisão da competição.

Os 40 times da 1ª divisão são, então, distribuídos em 4 grupos para os playoffs (algo como “jogos antes da competição”) e em subgrupos chamados seeds (na tradução literal, “sementes”) da seguinte forma, levando em conta sua posição no ranking:

Vemos, por exemplo, que a primeira seed é composta dos primeiros 4 times do ranking, e o primeiro playoff é composto do 1º, 8º, 9º, 16º, 17º, 24º, 25º, 32º, 33º, e 40º colocados do ranking.

A distribuição dos times segue um modelo chamado S-curve Seeding (na tradução literal, “curva S de semeadura”) com a intenção de que, dentro dos playoffs haja uma distribuição homogênea e igualmente espaçada de times mais ou menos difíceis de se jogar contra, e que dentro das seeds hajam times igualmente desafiadores.

A partir dessa distribuição, ocorrem os jogos de cada um dos playoffs, como mini-campeonatos antes do campeonato final, cada um em uma data e local diferente, com 10 times competindo. De acordo com a seed em que o time está, ele é distribuído nas chaves de competição:

A imagem acima reflete a competição que ocorrerá em cada um dos quatro playoffs, já que cada um deles tem um time de cada seed.

Os times das seeds 7, 8, 9 e 10 estão mais baixo no ranking que os demais, e a estrutura da competição garante que eles joguem entre si antes de competir com os times melhor rankeados. Essa estrutura é comum a diversos esportes, garantindo que dois times supostamente melhores (de acordo com o ranking) não se enfrentem tão cedo na competição, eliminando um ao outro, o que daria chance para um time supostamente pior (de acordo com o ranking) terminar a competição numa posição melhor que estes. Assim, não há sorteio nas chaves da competição.

Também pela estrutura da competição, nem todos os times se enfrentam (o que seria bastante exaustivo, com 10 times) e cada time joga 3 ou 4 jogos.

A competição segue o esquema “mata-mata”, em que um time precisa ganhar todos os seus jogos para ser o vencedor, na primeira chave de jogos chamada de Elimination Bracket (“chave de eliminação”). Os times que perdem passam para a Consolation Bracket (“chave de consolação”) em que competem os jogos de 5º lugar para baixo dentro da competição. Na imagem podemos ver claramente como a classificação final da competição acontece.

Os times que ficam em 1º, 2º ou 3º lugar em seus respectivos playoffs (12 times ao total) competem no International WFTDA Championship propriamente dito. De acordo com sua posição nos playoffs (e não importando mais sua posição no ranking da WFTDA) os times são distribuídos nas chaves da competição. Segue exemplo do Championship 2015, em que a posição do time no playoff estão indicadas ao lado de seu logo, e os playoffs são diferenciados de acordo com as cores azul, amarela, rosa e verde.

No exemplo acima, Gotham Girls Roller Derby, Angel City Derby Girls e Minnesota RollerGirls foram respectivamente 1º, 2º e 3º lugar no playoff que competiram. As chaves garantem que os times joguem com times de diferentes playoffs ao menos até as semifinais. Também como nos playoffs, nem todos os times jogam entre si, e o esquema de competição é do tipo “mata-mata”.

Por outro lado, não há jogos em uma “chave de eliminação”, dessa forma apenas quatro times saem classificados como 1º, 2º, 3º e 4º lugar da competição, e os times que perdem seu primeiro ou seu segundo jogo estão eliminados da competição e não jogam mais. Assim, os times podem jogar 1, 2, 3 ou 4 jogos ao total, de acordo com seu desempenho.

Os jogos dos playoffs e do campeonato (entre outros) servirão de base para o ranking da WFTDA, que serão usados na competição do ano seguinte.

Para acompanhar notícias sobre o International WFTDA Championship, acesse o site da WFTDA e acompanhe jogos ao vivo na wftda.tv.

Carol Contravenção #10

Recrutamento das Wheels!

por Juju

No último domingo de agosto [28/08], a WoF teve mais um recrutamento cheio de novidades! Para quem que, como eu, já tinha ido nos recrutamentos anteriores e teve a oportunidade de conhecer as meninas do Derby e cair altos tombos de patins testar suas habilidade de patins, saiba que nesse recrutamento teve muito mais que isso! Fomos da história do Roller Derby ao jogo de contato sem patins entre as participantes.

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Apesar do dia ter sido nublado, nossos corações estavam radiantes com a vontade, a curiosidade e a dedicação das nossas possíveis recrutas! Todas estavam atentas à pequena aula introdutória ao Roller Derby e não se constrangiam em tirar suas dúvidas e dificuldades no entendimento do jogo. Aliás, dúvidas são as que mais surgem quando descobrimos esse esporte, pois, uma coisa é certa, ao vê-lo pela primeira vez, sem alguém para explicar, a visão que temos é que aquilo não passa de uma pancadaria sobre rodinhas. Só que não! É um esporte com várias regras importantíssimas que visam à integridade das jogadoras e à dinâmica do jogo. As principais regras puderam ser observadas por nossas curiosas participantes através das orientações de nossos Oficiais: Gabriel e Luiz.

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Quando eu participei do meu primeiro recrutamento WoF a minha maior expectativa era andar de patins. Certamente não deve ter sido diferente nesse domingo. Por outro lado, para nós, WoF, o momento mais divertido definitivamente foi o Tênis Derby. Isso mesmo! Ao invés de patins, as meninas se equiparam e foram de tênis pra track aprender como é o jogo na prática. Teve risada, tombo, articulações e estratégias que partiram das próprias iniciantes que se envolveram e dominaram o jogo de maneira tão natural que nem parecia que aquela era primeira vez que estavam entrando em contato com o esporte.

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O recrutamento terminou com aquele passeio gostoso sobre rodinhas seguido de mais alguns tombos, tremedeiras, risadas, desequilíbrios, frio na barriga e “opa! Quase que eu caio!”.

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Por fim, gostaríamos de agradecer a presença de todos e deixamos o convite para a visita aos treinos abertos que acontecem aos sábados a partir das 18hs.

Juju.

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Roller Derby, Do It Yourself e Vida Profissional :D

Já se foram quase quatorze meses desde que eu conheci as wheels e comecei a treinar. E já se foram seis meses desde que eu comecei a atuar no comitê de treinamento, primeiro planejando e passando treinos de habilidades mínimas, e hoje planejando e passando treinos de habilidades avançadas, estratégia e jogo também. Era uma coisa que eu queria muito, que chegasse o final de 2015 e eu pudesse me candidatar para participar de algum comitê e ajudar a equipe, e ao mesmo tempo me dava medo, pois se eu estava treinando há apenas oito meses, como eu iria ensinar e passar exercícios para meninas que estavam ali há muito mais tempo que eu?

Confesso que nos primeiros treinos eu me senti insegura e com vergonha de fazer alguma coisa errada, mas logo fui percebendo a importância de estar ali, como as jogadoras depositavam expectativas no que eu estava passando para elas, e conseguindo também analisar as situações de treino, jogos e de jogos externos, a fim de contribuir cada vez mais para o crescimento do time! Consequentemente eu comecei a querer que a política do “do it yourself” (faça você mesmo), que é muito presente no roller derby, fizesse parte da minha vida pessoal e profissional também. E foi a imensa bagagem que eu já carrego em apenas quatorze meses de derby que me incentivou e me fez acreditar que era possível.

Identifiquei uma infinidade de semelhanças nas posições de jammer e blocker com meu trabalho como designer, que é um processo de solucionar problemas composto por várias etapas – briefing, pesquisa, conceituação, desenho, ajustes, finalização. O roller derby é um esporte que trabalha técnicas e estratégias, bem como o processo de design, e em cada drill, treino, jogo jogado, jogo assistido, conversa sobre derby, eu passo por esse mesmo processo: de identificar um problema, pesquisar e pensar como resolver, e dar tudo de mim enquanto trabalho nessa solução!

O “faça você mesmo” e o “vai lá e faz”, que regem o trabalho em uma equipe de roller derby, tomaram conta de mim e eu percebi com tudo isso que eu posso, sim, trabalhar e chegar aonde eu quiser, basta eu enxergar o meu lugar hoje, e o lugar que eu quero estar amanhã. Ainda faz pouco tempo que eu tomei a decisão de não trabalhar mais em uma agência de propaganda ou em um escritório de design, mas foi tempo suficiente pra tirar a bunda da cadeira em outros âmbitos da minha vida, e ver as coisas acontecerem do mesmo jeito que elas vêm acontecendo pra mim no esporte. ❤

Miss Mulder 00 | designer e artesã